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Crônica: A Estátua que Chora:




Introdução: Esta é uma crônica inicialmente concebida durante um passeio pelo Campo do Santana, parque localizado no bairro do Centro, no RJ. Ela apresenta uma visão melancólica sobre a vida cotidiana e o ritmo das coisas na cidade grande. Que agravam sentimentos de solidão por exemplo. Tema bastante presente nos dias de hoje em meio a sociedade virtual. Pessoalmente, gosto bastante dela. Pois, é um texto que traduz não somente meus sentimentos, mas daqueles que costumam ser mais introvertidos e observadores. Por isso, a personificação da estátua que chora é ideal. E foi a imagem da estátua no parque debaixo da chuva, que me inspirou. Espero que gostem.    


---**---
Eu sempre estive aqui à observar, mas ninguém nunca me observou de volta. Não olhando diretamente em meus olhos, pelo menos. Talvez, tenha sido a frieza de minha superfície que os afastou para sempre. Impedindo-os assim de me reconhecerem. A mim, a estátua que sempre os acalentou com olhos vagos, porém, cheios de esperança sobre seu passo apertado, enquanto se perguntava: 

"Para onde irão"? "Por que riem"? "Por que estressam-se"? "Por que choram"? "Por que beijam-se"? "Por que sempre vão, enquanto eu apenas fico"?

Então percebi...  

...Percebi que sou e sempre fui diferente deles, e por isso nunca poderíamos nos conectar. Pois vivo em outro tempo. Enquanto o deles flui, quase sem controle, lhes escorre pelos dedos e obriga-os a correr para alcançá-lo, o meu não. Meu tempo é estático e assim permaneço. 

Permaneço o mesmo sob a sombra da velha árvore, eu permaneço. Ainda que debaixo do sol ou da chuva, eu permaneço. E pude diante deste tempo, tão persistente, notar que mesmo sem ir a lugar nenhum meu mundo ainda é maior do que o de muitos. Isso porque, ainda sou capaz de sentir e sentindo eu choro por ele. Por este mundo que ao mesmo tempo é lindo e também terrível. E cuja beleza vive em seu contraste, podendo ser o paraíso e inferno. Cheio de sombras e também de luzes, que desenham as formas daqueles que por mim passam tantas vezes ao dia, correndo atrás do tempo. 

Poderiam eles, os que correm, captar a essência de algum instante e sentir o que a natureza é capaz de lhes proporcionar? 

Sentir... Apenas sentir, aquilo que é bom em si mas, é indefinido porque nem homem, de carne ou de pedra, foi capaz de nomear. Porque é isto, o inominável é o que sinto, quando olho a beleza que existe, acima e abaixo deste céu. 

Será que podem sentir como eu sinto? Será que seriam capazes de penetrar meu olhar e perceber o que há por detrás do vazio? Perceber talvez que nada é vazio? Nem mesmo a estátua que chora, enquanto lágrimas de chuva formam-se em sua face petrificada. 

Choro por significar a tudo e todos e ninguém tornar-me significante. É solitário apreciar a beleza do mundo sem ter com quem dividir. Mas hoje foi diferente. Hoje uma mulher me avistou, e enquanto todos corriam apressados, ela parou por um instante e admirou-se! Apreciou-me como algo belo. Não sei que beleza teria ela visto, mas mais do que isto... Teria ela percebido minha essência? Teria ela, durante aquele curto instante, a capturado? Será que levará consigo um pouco de mim para onde quer que tenha ido? 

Não há como saber. Contudo, aqui continuarei. Do meu pedestal solitário, continuarei a desejar que sim... e permanecerei a observar. É o que me resta. 



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Obrigada pela leitura! :) 

Se gostarem, deixem nos comentários por favor. 
Lembrando que críticas, dicas e opinições (desde que ditos com respeito),
são muito bem vindos. 

Texto e Imagem por Sandy de Souza.

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